SOMBRAS SOMENTE

27 fevereiro, 2007
  NIETZSCHE NÃO MATOU DEUS
NIETZSCHE NÃO MATOU DEUS

A arara é um animal de beleza única. Com uma plumagem exuberante e porte gracioso, encanta a todos. Ademais é falador.
E como é interessante ver um irracional querer falar como o homem.
É preciso, no entanto, muito cuidado com a arara.
Possuidora de fortes mandíbulas (...) pode quebrar um dedo ao receber um afago em suas plumagens.

Nietzsche bem lembra uma arara.
Tenta falar como os homens por meio de embelezados aforismos, mas que podem resultar em fraturas éticas pela sua forte bicada.
Sim. Admirar Nietzsche pode causar danos e suas palavras estão longe de ser a voz humana.
É apenas um mero imitador delas.
Um tagarela exacerbado em busca de sua doente ufania.
Um pretensioso ao endeusamento, mesmo negando a existência desses.
Mas será que acreditava realmente que deuses não existem?
Não creio.
Como já ressaltei em uma de minhas postagens, Nietzsche apenas não podia admitir a existência divina porque ela feria profundamente as suas ambições e contrariava alguns de seus comportamentos.
Recorria ao ateísmo buscando, entre outros motivos, uma desculpa para seus atos e idéias. A mesma que é sutilmente oferecida a Dimítri, pelo seu irmão Ivã Fiodórovith: “Se Deus não existe, tudo é permitido”.
Melhor ainda... Para Nietzsche, essa existência era um grande desconforto.
Arrebanha então Dostoievski para o seu rol de pensadores a ser lidos e admirados, embora não tenha certamente afeição alguma a Smerdiakov e não poderia prever o mesmo fim a si que teve Ivã Fiodórovith ao acreditar e expor seu fatídico artigo.
Temeroso em apresentar uma filosofia encarnada em um homem superior, abandonando alguns preceitos básicos de correntes filosóficas alicerçadas no judaísmo e cristianismo busca, sem perceber a incoerência, auxílio em Zoroastro.
Esquece que o masdeísmo é uma religião revelada. A primeira delas.
Percebe o engano.
Vê que isso pode ser inaceitável.
Que ele próprio pode desmoronar pelos seus atos, principalmente na questão do incesto.
Decide então, como ponta de lança de suas idéias, destruir totalmente seus incômodos antagonistas.

“O Evangelho morreu na cruz”.
“Deus está morto. Viva Perigosamente”.

Sim. Viver no incesto é mesmo muito perigoso.
Possui consciência de tal fato.
Altivo, vê-se à beira do abismo, contudo.
Precisa de apoio.
Busca algum na música de Wagner, que eleva sem enternecer.
Procura desesperadamente palavras que o possam redimir de alguma forma.

“Aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal.”

Uma mentira não suficiente para encobrir seus erros.
Ele bem sabe.
Precisa de outros alvos.
Volta-se então contra as mulheres.
Procura jogar talvez a culpa na irmã ou na própria mãe.

“A mulher foi o segundo erro de Deus”.
“Onde não intervém o amor ou o ódio, a mulher sai-se mediocremente”.

Não é suficiente, contudo.
Há eternos vigilantes da Ética e da Moral que precisam ser igualmente aniquilados.
Vira-se contra esses, então.
Combate Sócrates, Platão, Aristóteles, Kant, Lutero...
Mas está confuso.
Seus conhecimentos de filologia o fazem produzir máximas de belo efeito, mas não fortes o suficiente para sustentar a si próprio.
O que o leva a cair em uma cascata de contradições.

“As convicções são cárceres”.

Estaria preso então, pelo seu ateísmo.

“Até Deus tem um inferno: É o seu amor pelos homens”.

Admite aqui o seu falso ateísmo.

“Não posso acreditar num Deus que quer ser louvado o tempo todo”.

Revela um dos porquês desse falso ateísmo.
Diz claramente nessa frase que a negação é fruto não pela causa em si, mas pela conseqüência que o contraria.
Ainda procura se amparar em métodos de seus próprios opositores. Tenta uma última pá de cal sobre sua afirmação em um silogismo que mais parece provir da mente desvairada que agora fortemente sinaliza, do que do intelecto superior que realmente tinha.

“Se deuses existissem, eu não suportaria não ser um deles. Portanto, deuses não existem”.

A baba de um epiléptico.
Aristóteles bem acompanharia Sócrates em outro cálice de cicuta por essa afronta a um de seus estudos, mas não creio que mandasse pagar o galo de Asclépio.
Desesperado escreve uma biografia que acredita ser capaz de ‘reanimá-lo’.
O título é prova da loucura já totalmente acometida e que o prepara a uma residência em manicômio.
Ecce Homo (Eis o homem).
Afirma ser essa a sua maior obra e de toda a humanidade.
A prepotência revelada.
O amor à grandiosidade.
E nem se dá conta que com essas palavras o filho do Criador foi apresentado aos judeus por Pilatus.
Ironicamente, a loucura também parece provir do latim: Treponema pallidum.
Tenta e consegue enganar seus futuros biógrafos.
Diz que não quer ser idolatrado ou santificado, mas no fundo é uma forma sutil de lembrar a futuras gerações essa possibilidade, pois sem perceber o deslize, profetiza:

“Conheço minha sina. Um dia meu nome será ligado à lembrança de algo tremendo”.

Mas é o fim.
Jamais será santificado como previne em sua engenhosa artimanha de tal contrariedade.
Ficará impune por muitos anos, no entanto. Enganando com seus belos, mas falsos aforismos, gerações e biógrafos.
E a baba sifilítica que seu cérebro derramou ainda nos mela terrivelmente.
Em ‘Minha Irmã e Eu’, de autoria duvidosa por muitos e que tenho como certa, descarrega reflexões de uma alma agora ansiosa por remissão, absorvidas talvez já nos corredores do sanatório da Basiléia. Uma última tentativa de justificar sua incômoda filosofia, e na verdade, observando atentamente essas linhas, percebe-se um real arrependimento.
Tal obra, editada anos depois de sua morte, é totalmente desnecessária, pois como já disse, suas idéias terminariam mesmo impunes..
E na verdade, termina Nietzsche sendo superior a muitos pensadores que se revelaram em uma ética fiel e crente, pois sua postura, ainda que falsamente herética, teve a coragem grandiosa de tentar combater verdades secularmente reconhecidas.
De tentar se opor a dogmas e exterminar deuses humanamente reconhecidos.
Enquanto muitos apenas desfilaram pelos séculos com verdades que não trouxeram nenhum efeito prático ou moral.
É bastante superior a mim que o critico por tentar destruir humanitários conceitos judaico-cristãos, mas que sou incapaz de abandonar um capítulo da novela das oito para levar a sobra da janta às maltrapilhas e abandonadas crianças que se deitam na calçada do quarteirão vizinho.
Pela manhã a doméstica jogará no lixo.
 
Comments:
Se deus existisse, agradeceria a ele, todo santo dia, pelo Estado laico; não é, meu caro? Um abraço.
 
muito bom....hêhê... tópico polêmico... amo Nietzsche, mas acompanhar todo o racicinio deste camarada exige um grau mínimo de loucura.... parabéns aí... bom trabalho
 
Amigo, senti-me meio vingado...
Por ele totalmente, mas pelos seus apaixondos em facções reunidas...
Bem, se pelo menos eles lessem!
Ego bem típico de cólera e amargurada alma, sem rumo, e que ainda outras das sargetas filosóficas, de uma casta sem amor nem senso até gosam...
Eterna insatisfação e inveja do belo, é o que seus seguidores "gozam" e demonstram na prática de seus dias
politicando...
Parabéns amigo, só lamento não ter sido eu a dizer tudo o que disse, desse ego... (Riso merecido e com satisfação)
 
Seri Nietzsche uma mente doentia ou um espirito sem luz da sargeta!!!Acredito nas duas hipoteses e mais algumas!!!a psicologia diria os seus desvairados penssamentos!!!hehehe
Belo e inteligente texto!Voce é um anjo iluminado!!!Bjs!!!
 
Eu ia defender Nietzsche, posto que O Anticristo está entre meus livros favoritos.


Aí eu lembrei que eu bombei em Filosofia e que, provavelmente, por mais que eu tenha gostado do livro, eu não entendi porra nenhuma do que ele quis dizer.


Então, no fim desse ano, quando tiver cumprido a DP, responderei ao post.

No momento, é melhor eu adquirir consciência própria e trocar, no meu perfil, "O Anticristo" por "Harry Potter e a Pedra Filosofal", "O Código da Vinci" ou "O Alquimista". Combina mais com meu perfil de reprovado em Filosofia.


PS: A honra é minha de ter teus comentários por lá! Traçando um paralelo próximo à minha realidade, é como se o Petit ou o Olivetto chegasse e falasse "Pô, legal o slogan que você bolou pra esse anúncio".
 
Caro Sombras, sou um apaixonado nato por Nietzsche, conforme já deve ter notado. E como todo apaixonado faz, acabo me excedendo. Claro que o próprio Nietzsche era um exagerado. Nietzsche era sim um buscador de Deus como eu também me considero...mas que não suportava a concepção de deus que a sociedade no todo lhe atribuia.
Em um post recente meu , eu disse que deus não existia...pelo menos não aquele que dizem que existe. E continuo afirmando isso... e acho que Nietzsche (no fundo) compartilharia de minha opinião.
Na verdade me vejo como um grande buscador de deus...busco tanto a deus que fico 'puto' por nao encontrá-lo disponível. Entendo Nietzsche da mesma maneira.
Só espero não enlouquecer também...quando isso estiver bem próximo de acontecer, contrato duas putas de internet, compro tres garrafas de Amarula e mando a filosofia da vida pra puta que o pariu. Mas acho que ainda estou longe disso...
 
Caro Sombras topico muito belo...gostei...mas vejo que no final, mesmo depois de ter atacado Nietzsche de todas as formas possuiveis, você conclui que ele é alguem merecedor de respeito...afinal pelas suas proprias palavras, Sombras: "É bastante superior a mim que o critico [..] mas que sou incapaz de abandonar um capítulo da novela das oito para levar a sobra da janta às maltrapilhas e abandonadas crianças que se deitam na calçada do quarteirão vizinho."

um abraço
 
I like That
 
Pois é, amigo, como você é presente!
Chegou rápido ao "Sótão e Porão", hem?
Não só concordo contigo, como penso na mesma direção. Sigamos juntos, pois pertencemos à mesma tribo. Muito sucesso, querido, sempre. E avise-me quando postar seus magníficos textos.
Para que eu mergulhe em novos encantamentos.
Com ternuras e delicadezas,
A amiga.
 
Cade o post novo da semana?
 
Porcaria de comentário, redutor, baseado nas passagens menos interessantes. Mostra-se aí apenas um falador pueril, que ataca Nietzsche justamente naquilo que ele tem de fraco. É óbvio que a megalomania de Nietzsche é uma bosta. Assim como vocÊ, mister sombra (que aliás não mostra a cara, pois é somente uma sombra na caverna de Platão) Borges atacou Nietzsche justamente no que ele tinha de mais fraco: os pensamentos inconclusos e incoerentes, como por exemplo o Eterno retorno. Borges faz umas continhas matemáticas tolas, após reduzir Nietzsche a um atomista, e crê que com isso basta. "Nietzsche o infame", oh! "Nietzsche, o difamador de mulheres", oh!
Ficam intactos os argumentos esgrimidos por ele na Genealogia da moral, Aurora, Humano demasiado humano: a necessidade de um filosofar histórico. Engraçado o mister sombra fazer uma velada defesa de Kant, queria vÊ-lo defender um sujeito transcendental na cara de pau, defender os imperativos categóricos na cara de pau, defender o reto entendimento na cara de pau; defender tudo isto diante da hipótese nietzscheana da sujeição ao devir, à contigência e às vicissitudes do "homem consciente".
Dirás, ó Sombra, que quero ressaltar somente uma parte do pensamento de Nietzsche e ocultar as outras (aquela do aristocratismo podre, da legitimação da violência e do desrespeito à mulher). Que seja. De fato, pelo menos a mim, interessa aquilo de Nietzsche que é capaz de esclarecer, deixo as picuinhas e miudezas inúteis aos faladores, aos filósofos de bar.
Enquanto uns pobres diabos só conseguem lembrar da tolice do "Deus morreu" (aliás, muito mal-interpretada por eles, pois ela é o arremate de um longo raciocínio , não sendo anunciado do nada, de supetão, como querem os ignorantes) e ainda da idiotice do "vais ver uma mulher, não te esqueças do chicote"; enquanto isso, prefiro ainda pensar na segunda dissertação da Genealogia da moral, meditar a respeita da "ativa faculdade do esquecimento" (aliás, "esquecida" por Kant), meditar a respeito de toda a crueldade que nos foi exigida para com nós mesmos para podermos ser "homens modernos". Enfim, pensar no que interessa!
 
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