SOMBRAS SOMENTE

23 novembro, 2006
  UM CASO DE AMOR PERDIDO

Aquele era um dia de festa na pequena, porém formosa, cidade de São João do Buriti, situada no planalto da Borborema.
O lugarejo de quatro mil habitantes, não era acostumado com celebrações de casamentos, pois os rapazes, nesse fenômeno comum das pequenas vilas nordestinas, estavam sempre buscando centros onde tivessem maiores oportunidades, como Caruaru, por exemplo, ou até mesmo a capital pernambucana, caso fossem de famílias mais abastadas. Mas Lino Ventura, criador de porcos e prefeito do município, tudo fez para que sua única filha Marianita, não entrasse no imenso rol das solteironas de São João.
Logo que percebeu o interesse da moça pelo jovem Salustiano, um rapaz extremamente estudioso, honesto, trabalhador e muito bem educado, filho de Severino Silva, próspero comerciante da região, proprietário do Armazém Jabá & Jabá, localizado na principal e única rua asfaltada da cidade, tratou de aliciar o mancebo para um enlace matrimonial com a rebenta.
E tinha chegado o dia.
Os buritienses estavam todos aglomerados na pracinha defronte à igreja onde se celebrava a festa pós-núpcias, esperando a saída dos noivos que embarcariam num belo fusquinha que os levaria a Garanhuns. De lá pegariam pegariam um ônibus com destino ao Recife, local escolhido para a lua de mel.
Não faltaram lágrimas às despedidas, e assim que esses se foram as garrafas de Pitu que havia no Bar do Zeca, não foram suficientes para regar toda a alegria e os comentários dos presentes.
As bodas estavam previstas para doze dias e o tempo ia passando.
Decorridos nove, a mãe de Marianita, Francisca das Dores, estava repleta de saudades da única filha, companheira e amiga.
Contava as horas para o regresso dos jovens.
Curiosa e cheia de ansiedade formulava mil perguntas que faria à moça ao chegar.
Exigiu firmemente que o marido matasse mais um porco para ser assado no primeiro jantar de retorno dos recém-casados.
_ Está louca? Já não matei dois na festa de casamento?
“Mas tudo bem. A ocasião merece e ainda me sobram treze”: analisou pensativo, depois de considerável relutância.
Do mesmo fusquinha desembarcaram num cair de tarde dominical.
Francisca das Dores foi logo abraçando a filha e levando-a para a cozinha sob o pretexto de verificar se o leitão estava no ponto.
Queria as novidades. Mais precisamente, todas as “novidades” do enlace.
E, enquanto Lino Ventura enrolava uns cigarrinhos de palha para serem apreciados após o jantar, a mãe ao pé do fogão, assediava Marianita numa mal disfarçada busca dos segredos de alcova.
Logo percebeu alguma coisa errada.
A filha só falava dos locais percorridos em Recife e da satisfação de ter conhecido o mar. Mas Francisca desejava outras “novidades”.
Depois de muito lero-lero e enrolação por parte de Marianita, resolveu ir direto ao assunto.
_ E na cama, eu quero saber na cama como foi?
Aí veio a tragédia.
Salustiano não a havia tocado.
_ Do jeito que fui, retornei. — revelou a filha com a face mais branca que calcinha de freira, pois bem conhecia o temperamento da velha.
Ficou indignadíssima, claro. Virada na serpente.
Quis logo ir falar com Lino para que ele tomasse satisfação com o rapaz, mas reparando que o quadrúpede já estava bem assado, resolveu adiar para depois da janta que transcorreu, salvo os elogios do genro às iguarias, quase totalmente em silêncio.
Lino percebendo os olhares que a mulher havia lhe lançado durante todo o tempo da refeição, assim que essa findou, acompanhou-a até a cozinha sob o pretexto de ajudar na retirada dos pratos para saber o que estava havendo.
A princípio nem quis acreditar.
_Tem certeza? — vociferou o homem.
_ Mais pura do que aquela garrafa de cachaça do compadre Tião. — reforçou Francisca.
Durante alguns minutos o homem ficou rodopiando a cozinha.
Parecia imitar as moscas que ali sobrevoavam.
_Vou falar com ele. _ decidiu então.
_ Veja como fala. _ aconselhou Francisca.
_ Sei resolver essas coisas, mulher. _ salientou.
Adentrando a sala, foi logo chamando Salustiano para darem uma pitadinha nos cigarros que havia preparado, enquanto as mulheres terminavam de retirar os pratos e se punham a lavar a louça.
_ E como foi no Recife? _ perguntou ao genro assim que elas se retiraram.
_ Muito...Muito bom! _ respondeu o rapaz.
_ Conte então os prazeres. —_ olicitou Lino Ventura.
_ Quase todas as manhãs íamos a praia de Boa Viagem. Uma maravilha. Marianita ficou encantada.
_ E que mais? — insistiu o homem.
_ Pela tarde visitávamos os pontos turísticos recomendados num livrinho que comprei numa banca de jornal. _ retomou Salustiano _ Conhecemos a ponte no centro da cidade que o holandês Nassau mandou construir a quase quatro séculos atrás, mas achei que não estava muito bem conservada.
_ E que mais? Fale-me dos prazeres. _ começou a se apoquentar o sogro.
_ Visitamos também Olinda e suas igrejas maravilhosas.
_ De noite. O que faziam de noite? _ perguntou num tom já visivelmente irritado.
_ Íamos quase sempre a um barzinho no centro antigo da cidade. Um local sempre muito freqüentado e que...
_ Eu falo de cama, meu filho. Eu falo de cama, rapaz. O que minha filha gosta mesmo é de PICA, homem. _ explodiu o velho.
E Salustiano, num desses fatais momentos de descuido que acometem ingratamente o ser humano e dão rumo diverso a toda uma vida, colocando uma das mãos na cintura, numa simulação de asa de xícara, exclamou: _ Ô xente, e quem não gosta?
 
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